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Aspecto trabalhista da Lei de Recuperação e Falência é constitucional, diz PGR
A PGR (Procuradoria Geral da República) considera constitucional artigo da nova Lei de Recuperação Judicial e Falências que prevê isenção de responsabilidade por dívidas trabalhistas em eventuais sucessões de empresas.
Priscila Cury
A PGR (Procuradoria Geral da República) considera constitucional artigo da nova Lei de Recuperação Judicial e Falências que prevê isenção de responsabilidade por dívidas trabalhistas em eventuais sucessões de empresas. Este foi o entendimento do procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, em parecer enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal).
De acordo com informações da PGR, o parecer opinou pelo não-conhecimento ou pela improcedência da Adin (ação direta de inconstitucionalidade) ajuizada pelo PDT (Partido Democrático Trabalhista). O partido contesta artigos da Lei 11.101/2005. A procuradoria emitiu um no começo de janeiro e a ação já está com o relator, ministro Ricardo Lewandowski, para ser julgada no Supremo.
Desde que entrou em vigor, a Lei que regula recuperação judicial, extrajudicial e a falência de empresário e de sociedade empresária, gerou algumas discussões jurídicas, especialmente sobre as disposições feitas a respeito dos direitos dos trabalhadores.
Em processos de recuperação judicial, como é o caso da Varig, a Justiça tem discutido questões de competência entre a Justiça comum e trabalhista, além de debater a questão das obrigações de empresas sucessoras.
Para os advogados Marcelo Rodrigues e Fábio Rosas, do escritório Tozzini Freire, a Lei 11.101, em razão do pouco tempo de vigência, ainda tem pontos não esclarecidos pela jurisprudência.
Eles afirmam ainda que, por ter um papel social relevante ao objetivar a recuperação de empresas, o que preserva a economia como um todo e as vagas de emprego, a norma gerou decisões de defesa no Poder Judiciário em um primeiro momento. Atualmente, o mundo jurídico começa a encarar a lei de uma maneira mais estudada e embasada.
“As primeiras decisões e determinações sobre a Lei de Recuperação Judicial e Falência foram mais apaixonadas. Atualmente, a Justiça vive uma segunda onda, de decisões que são mais reflexivas e racionais”, sustentam os advogados.
Adin
O PDT, autor da ação, sustenta que, nas hipóteses de alienação judicial, descritas nos artigos 60 e 141, teria existido “descaso com a valoração do trabalho e a dignidade dos trabalhadores, na medida em que os eventuais arrematantes de empresas e seus ativos foram liberados de quaisquer ônus de natureza trabalhista”.
Além disso, o partido alega a impossibilidade de norma infraconstitucional estabelecer formas de extinção de emprego, sem que o direito social e a dignidade do empregado sejam observados.
Na Adin, afirma-se que a hipótese em questão “passará a constituir caminho fácil para o desrespeito aos direitos adquiridos pelos empregados no curso da relação desenvolvida com seu empregador, que vindo a prestigiar outros credores comuns e, uma vez acumulando com eles grandes dívidas, delas poderá se livrar com a simples realização de uma alienação judicial em falência”.
O partido diz ter sido criada, por meio de lei ordinária, nova forma de extinção de emprego, sem garantias ao funcionário, o que, no entender do PDT, somente poderia ter sido feito por lei complementar, por força do disposto no inciso I do artigo 7º da Constituição Federal.
O PDT assevera que o caso guardaria relação com o julgamento do Supremo na Adin 1721, que declarou a inconstitucionalidade do parágrafo 2º do artigo 453 da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), segundo o qual o ato de concessão de benefício de aposentadoria importaria em extinção automática do vínculo empregatício.
Neste ponto, defende-se que a única diferença em relação a presente ação seria a de que naquela o ato jurídico gerador da extinção automática seria a aposentadoria, enquanto nesta, a simples alienação da empresa em processo falimentar.
O partido questiona, também, o artigo 83 da Lei 11.101/05, que considerou como quirografários (sem nenhuma garantia) os créditos trabalhistas que excederem a 150 salários mínimos. Por isso, teria desrespeitado direitos adquiridos, ao argumento de que, “ao alterar os critérios de classificação de créditos, teria atingido retroativamente direitos constituídos antes de sua vigência”. O PDT ainda menciona possíveis violações ao princípio da isonomia, às garantias dos direitos sociais do trabalho e do emprego, bem como ilegítima vinculação ao salário mínimo.
Parecer
O procurador-geral da República opinou pelo não-conhecimento da ação. Isso porque o PDT pediu a inconstitucionalidade do inciso II do artigo 141, mas não pediu a do parágrafo 2º do mesmo artigo. O primeiro dispositivo determina que “o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho”.
Antonio Fernando argumenta que, ainda que se admita as especificidades de cada parte do artigo, não há dúvidas de que, com base na previsão do parágrafo 2º (“O arrematante não responde por obrigações decorrentes do contrato de trabalho anterior”), iriam permanecer a cargo exclusivo do devedor as dívidas trabalhistas. Assim, de nada adianta impugnar o inciso II se o outro dispositivo também não for considerado inconstitucional.
No mérito, o parecer aponta para a improcedência da ação. O procurador-geral analisa que só o fato de a norma prever que o adquirente não se responsabiliza pelas dívidas do alienante contradita a hipótese de que este possa se livrar, já que, se não ocorrer a sucessão, permanecem com quem as contraiu.
Segundo a PGR, a simples previsão de transmissão de tais obrigações a um possível adquirente, de outro lado, em nada impactaria nas supostas extinções de direitos trabalhistas ou de contratos de trabalho.
Outro aspecto destacado pelo parecer é o suposto desrespeito à reserva de lei complementar, conforme o artigo 7º, inciso I, da Constituição Federal, para criar forma de extinção de emprego. Antonio Fernando responde que não há nenhuma previsão de extinção de contratos, pois a lei trata de uma situação futura, posterior a eventuais rompimentos de relação de trabalho. Tratam de uma de suas conseqüências: a responsabilidade pela quitação de débitos trabalhistas.
Além disso, o procurador-geral acredita que o artigo 7º , inciso I, da Constituição Federal se refere à hipótese de despedida arbitrária. Já o texto da Lei 11.101/2005, “por se relacionar com fatos alheios à vontade não só do empregado, mas do próprio empregador, nem de longe poderia ser equiparado a uma despedida, que dirá arbitrária”.
Antonio Fernando não viu inconstitucionalidade, também, no teto de 150 salários mínimos para a conversão de créditos trabalhistas em quirografários, ou seja, aqueles que não possuem nenhuma preferência ou garantia em relação ao seu crédito. Ele ressaltou que não há que se falar em perda de direitos, pois, independentemente da categoria em que se classifiquem, não deixam de existir, tampouco se tornam inexigíveis.
“Não se verifica, igualmente, qualquer discriminação ou irrazoabilidade, mas ao contrário, nota-se que o legislador, apesar de buscar dar maior possibilidade de pagamento às demais espécies creditícias, primou pela proteção da grande maioria dos credores trabalhistas, aos quais são devidas verbas rescisórias de menor monta”, afirma o procurador-geral.
Sobre a vinculação ao salário mínimo, Antonio Fernando entende que a proibição constitucional sobre o assunto diz respeito à utilização de tal parâmetro na qualidade de indexador de prestações periódicas, e não como forma de quantificar indenizações ou condenações.
O parecer da PGR será analisado pela ministro Ricardo Lewandowski, relator da ação no Supremo.